Acabei hoje de ler o livro que me acompanhava há mais de um mês. Sempre que acabo um livro no qual me envolvi na história e nos seus personagens, acabo por sentir a sua ausência. Afinal eles andaram na nossa cabeça durante algum tempo, acompanharam-nos em viagens, em momentos de lazer e de descontracção.
O livro que vos falo, também me causou essa sensação para o final, mas ainda assim, esperava algo completamente diferente. O título sugere um mistério, um suspense, um thrillher ou mesmo algo de espionagem «Comboio nocturno para Lisboa»… Até mesmo o início do livro, arranca logo, com o tal “gancho” que os guionistas chamam ao conflito ou reviravolta na trama que atrai o leitor ou o espectador, mas afinal o livro dá outras voltas…
A acção é iniciada em Berna, numa manhã invernal, numa ponte. Chove e uma mulher tenta saltar. Os ingredientes para uma boa história parecem estar lá todos…Mas, afinal a história não é sobre aquela mulher, que por acaso é portuguesa, mas sobre o professor de liceu de Grego e Latim, que tenta salvar a mulher do suicídio.
Este homem, com uma vida aparentemente normal, marcada pela força dos hábitos, pela leitura e pela solidão, é subitamente levado a abandonar a sua vida e partir em busca de novos caminhos. Sem se perceber bem porquê, e sobre a influência da mulher portuguesa que conhecera na ponte, ele começa a interessar-se pela língua portuguesa e descobre num alfarrabista um livro de um médico amante da literatura, o Amadeu Prado, intitulado «Ourives das Palavras».
A leitura deste livro em português, que o professor vai aos poucos entendendo, com dicionários e graméticas, norteia toda a acção do livro. O Professor Raimundo Gregorius, mete-se em marcha rumo a Lisboa, num comboio e descobre a cidade, onde viveu Amadeu Prado.
Gregorius empreende então uma autêntica viagem metafísica, onde vai descobrindo não a vida e a história de Prado, revisitando as pessoas que o conheceram e os locais onde vivia e trabalhava.
A acção é toda ela comandada por essa viagem, com uma certa dose de loucura de Gregorius, que aparece nesta narrativa, como o personagem errante, que deambula pela cidade, como se não tivesse energia e vontade próprias, mas o movesse o espírito de Prado.
A forma como o romance está escrito apresenta um estilo filosófico e reflexivo, reflectindo sobre o sentido da vida e da morte, questionando a noção de felicidade, lealdade, a importância da palavra e dos sentimentos. Este estilo é provavelmente influenciado pela formação do escritor Pascal Mercier, ou antes Peter Bieri, dado que esse é pseudónimo, uma vez que se trata de um professor de Filosofia.
Ainda que por vezes, este livro seja um labirinto de tensões e nos faça sentir um pouco perdidos, como o próprio protagonista da história, não deixa de ser um livro que está belissimamente bem escrito, que denota um grande conhecimento da cultura e história portuguesa, e além do mais, nos faz pensar e meditar sobre algumas das reflexões do mesmo. Só por isso, já valeu a pena.
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