Este estudo de Maria José Barriga, datado de finais da década de 90, e editado pela Colibri, em 2003, foi realizado no âmbito do sua dissertação de mestrado em Etnomusicologia, e tem como tema central a prática performativa do cante ao baldão.
Confesso que este livro já andava na estante há uma série de anos, mas tal como acontece com dezena deles, ainda não havia tido oportunidade de o ler, e foi com agradável gosto que o li e que descobri as peculiaridades deste cante do Alentejo.
Trata-se de um cante ao desafio que tem expressão nos concelhos de Odemira, Ourique e Castro Verde, sendo cantado por serrenhos (serra) e campaniços (da planície).
Até aos anos 40/50 do séc. XX, o cante ao baldão conheceu um grande florescimento nestes concelhos, diminuindo de atividade entre 1960 e 1980, devido a factores relacionados com a alterações no contexto sócio-económico desta região, denominadamente o abandono da agricultura e a emigração das suas gentes.
Este foi um cante marginalizado pela política cultural do Estado Novo, que viu no cante alentejano a vozes, um mote para a folclorização da região, criando estereótipos e imagens identitárias que camuflavam todos os outros modos de cantar. Neste sentido, como o afirma Maria José Barriga, «o cante alentejano passou a ser o emblema da identidade alentejana no contexto musical» da província do Alentejo, colocando à margem outras práticas musicais como o cante ao baldão « o cante a despique, o cante das gralhas, décimas silvadas, o cante do ladrão do Sado, das modas campaniças, dos balhos acompanhados à harmónica, ao harmónio, ao banjo ou à viola campaniça, as rezas à chuva, a encomendação das almas, ou práticas instrumentais como a do solo da viola campaniça, do banjo ou do tambolrileiro». (palavras de Maria José Barriga)
Após o 25 deAbril, apesar de existir uma profunda revitalização das tradições e da cultura popular, o cante ao baldão mantém-se sem ser referido, sendo a sua existência já quase inexistente na região. Foi sobretudo em meados dos anos 80, através da influência da rádio local Castrense que se começa a revitalizar o cante ao baldão.
Mais tarde surgem os Encontros de Cante ao Baldão, fomentados pela figura de Colaço Guerreiro, a Cooperativa Cortiçol e a Câmara Municipal de Castro Verde, que apresentam os melhores cantadores da região que ainda dominavam a prática performativa, a qual era até aí reservada às “vendas” e a certas celebrações familiares, embora muitas vezes os cantadores o fizessem num quarto interior da casa, pois não era bem aceite na localidade.
Para quem nunca ouviu falar no cante ao baldão, este consiste num cante de desafio, maioritariamente masculino, embora o presente estudo tenha revelado a presença de algumas mulheres a fazê-lo, acompanhado pelo som da viola campaniça. A sua componente verbal tem der ser sempre improvisada, enquanto que a melodia é regular e baseia-se num modelo. O texto tem de ter um “afundamento” que costuma basear-se em temas recorrentes, como a distinção dos modos de vida da serra e o campo, e os serrenhos e campaniços, e o passado e o presente.
Na época que a etnomusicóloga efetou esta investigação os principais focos de cante ao baldão localizavam-se na feira de Castro Verde, na romaria da Senhora da Cola, no Castro da Cola, no concelho de Ourique, entre outros encontros organizados institucionalmente. Com a progressiva folclorização e emblematização desta prática, o cante ao baldão tem vindo a alterar algumas das suas regras e contextos, deixando cada vez mais de ser espontâneo, mas embora mantenha o seu improviso, é mais encenado e apresentado em cima de um palco, circunstâncias naturais das tentativas de preservação cultural, pois por mais que queiramos manter a tradição original, para a manter no presente, temos necessariamente de ajustar ao presente e logo aí alteramo-la.
Se alguém conhece bem este cante e como está a ser vivido no momento presente, deixe aqui ficar o seu comentário, pois tenho curiosidade em perceber as mudanças deste este estudo de Maria José Barriga, quais as circunstâncias em que se continua a praticar, se tem tido mais adeptos, se estagnou, se evoluiu, até porque muitos destes cantadores apresentavam uma idade já avançada… em que locais é cantado, Todos os contributos são bem-vindos.
Confesso que este livro já andava na estante há uma série de anos, mas tal como acontece com dezena deles, ainda não havia tido oportunidade de o ler, e foi com agradável gosto que o li e que descobri as peculiaridades deste cante do Alentejo.
Trata-se de um cante ao desafio que tem expressão nos concelhos de Odemira, Ourique e Castro Verde, sendo cantado por serrenhos (serra) e campaniços (da planície).
Até aos anos 40/50 do séc. XX, o cante ao baldão conheceu um grande florescimento nestes concelhos, diminuindo de atividade entre 1960 e 1980, devido a factores relacionados com a alterações no contexto sócio-económico desta região, denominadamente o abandono da agricultura e a emigração das suas gentes.
Este foi um cante marginalizado pela política cultural do Estado Novo, que viu no cante alentejano a vozes, um mote para a folclorização da região, criando estereótipos e imagens identitárias que camuflavam todos os outros modos de cantar. Neste sentido, como o afirma Maria José Barriga, «o cante alentejano passou a ser o emblema da identidade alentejana no contexto musical» da província do Alentejo, colocando à margem outras práticas musicais como o cante ao baldão « o cante a despique, o cante das gralhas, décimas silvadas, o cante do ladrão do Sado, das modas campaniças, dos balhos acompanhados à harmónica, ao harmónio, ao banjo ou à viola campaniça, as rezas à chuva, a encomendação das almas, ou práticas instrumentais como a do solo da viola campaniça, do banjo ou do tambolrileiro». (palavras de Maria José Barriga)
Após o 25 deAbril, apesar de existir uma profunda revitalização das tradições e da cultura popular, o cante ao baldão mantém-se sem ser referido, sendo a sua existência já quase inexistente na região. Foi sobretudo em meados dos anos 80, através da influência da rádio local Castrense que se começa a revitalizar o cante ao baldão.
Mais tarde surgem os Encontros de Cante ao Baldão, fomentados pela figura de Colaço Guerreiro, a Cooperativa Cortiçol e a Câmara Municipal de Castro Verde, que apresentam os melhores cantadores da região que ainda dominavam a prática performativa, a qual era até aí reservada às “vendas” e a certas celebrações familiares, embora muitas vezes os cantadores o fizessem num quarto interior da casa, pois não era bem aceite na localidade.
Para quem nunca ouviu falar no cante ao baldão, este consiste num cante de desafio, maioritariamente masculino, embora o presente estudo tenha revelado a presença de algumas mulheres a fazê-lo, acompanhado pelo som da viola campaniça. A sua componente verbal tem der ser sempre improvisada, enquanto que a melodia é regular e baseia-se num modelo. O texto tem de ter um “afundamento” que costuma basear-se em temas recorrentes, como a distinção dos modos de vida da serra e o campo, e os serrenhos e campaniços, e o passado e o presente.
Na época que a etnomusicóloga efetou esta investigação os principais focos de cante ao baldão localizavam-se na feira de Castro Verde, na romaria da Senhora da Cola, no Castro da Cola, no concelho de Ourique, entre outros encontros organizados institucionalmente. Com a progressiva folclorização e emblematização desta prática, o cante ao baldão tem vindo a alterar algumas das suas regras e contextos, deixando cada vez mais de ser espontâneo, mas embora mantenha o seu improviso, é mais encenado e apresentado em cima de um palco, circunstâncias naturais das tentativas de preservação cultural, pois por mais que queiramos manter a tradição original, para a manter no presente, temos necessariamente de ajustar ao presente e logo aí alteramo-la.
Se alguém conhece bem este cante e como está a ser vivido no momento presente, deixe aqui ficar o seu comentário, pois tenho curiosidade em perceber as mudanças deste este estudo de Maria José Barriga, quais as circunstâncias em que se continua a praticar, se tem tido mais adeptos, se estagnou, se evoluiu, até porque muitos destes cantadores apresentavam uma idade já avançada… em que locais é cantado, Todos os contributos são bem-vindos.
4 comentários:
Parabéns pelo teu artigo. Conheci a autora num encontro, colóquio realizado há anos no Alentejo. O Pedro Mestre, na altura muito jovem, é o seguidor dos mestres que Maria José estudou.
Boa semana.
Obrigada Luís pelo teu contributo, por acaso este estudo deixou-me curiosa, é uma realidade completamente diferente do cante alentejano a vozes, mas igualmente fascinante.
E não é que a Marianinha da Estação esteve em Entradas, na inauguração do Museu da Ruralidade?
Bjs
Que maravilha...que pena não ter ido para ver, gostava de presenciar isso!
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