Um dos dramas do costume é a arrumação da mala, o que pôr nela, como arrumar as roupas dobradas e ajeitadas para que haja lugar para mais alguma coisa à última da hora. É fundamental levar na bagagem literatura que dê para as horas mortas, encher o mp3 de boa música e claro os guias de viagem, principalmente os das cidades de Praga e Viena, onde iremos ficar mais tempo.
Viajar tem esse lado curioso, é que não conseguimos desprendermo-nos completamente das nossas coisas e por isso vamos sempre tão carregados... Invejo os aventureiros que partem com tão pouco na mochila, apenas o mínimo dos mínimos...
Em tempo de ida de férias e partida, deixo-vos um poema do Fernando Pessoa sobre este drama de fazer a mala e de partir…com uma nostalgia que porém não sinto, pois viajar para mim é descobrir, é partilhar e nisso a alma alivia-se, não sofre. Boas Férias! Quando regressar partilharei as aventuras e os locais que mereceram maior interesse! Até meados de Agosto!
Grandes são os desertos, e tudo é deserto.
Não são algumas toneladas de pedras ou tijolos ao alto
Que disfarçam o solo, o tal solo que é tudo.
Grandes são os desertos e as almas desertas e grandes –
Desertas porque não passa por elas senão elas mesmas,
Grandes porque de ali se vê tudo, e tudo morreu.
Grandes são os desertos; minha alma!
Grandes são os desertos.
Não tirei bilhete para a vida,
Errei a porta do sentimento,
Não houve vontade ou ocasião que não perdesse.
Hoje não me resta, em véspera de viagem,
Com a mala aberta esperando a arrumação adiada,
Sentado na cadeira em companhia com as camisas que não cabem,
Hoje não me resta (à parte o incómodo de estar assim sentado)
Senão saber isto:
Grandes são os desertos, e tudo é deserto.
Grande é a vida, e não vale a pena haver vida.
Arrumo melhor a mala com os olhos de pensar em arrumar
Que com a arrumação das mãos factícias (e creio que digo bem).
Acendo um cigarro para adiar a viagem,
Para adiar todas as viagens,
Para adiar o universo inteiro.
Volta amanhã, realidade!
Basta por hoje, gentes!
Adia-te, presente absoluto!
Mais vale não ter que ser assim.
Comprem chocolates à criança a quem sucedi por erro.
E tirem a tabuleta porque amanhã é infinito.
Mas tenho de arrumar a mala,
Tenho por força que arrumar a mala,
A mala.
Não posso levar as camisas na hipótese e mala na razão.
Sim, toda a vida tenho tido que arrumar a mala.
Mas, também toda a vida, tenho ficado sentado sobre o canto das camisas empilhadas,
A ruminar, como um boi que não chegou a Ápis, destino.
Tenho que arrumar a mala de ser.
Tenho que existir e arrumar malas.
A cinza do cigarro cai sobre a camisa de cima do monte.
Olho para o lado, verifico que estou a dormir.
Sei só que tenho que arrumar a mala,
E que os desertos são grandes e tudo é deserto,
E qualquer parábola a respeito disto, mas dessa é que já me esqueci.
Ergo-me de repente todos os Césares.
Vou definitivamente arrumar a mala.
Arre, hei-de arrumá-la e fechá-la;
Hei-de vê-la levar de aqui,
Hei-de existir independentemente dela.
Grandes são os desertos e tudo é deserto.
Salvo erro, naturalmente.
Pobre da alma humana com oásis só no deserto ao lado!
Mais vale a arrumar a mala.
Fim.
Álvaro de Campos
3 comentários:
Amiga, desejo-te umas óptimas férias.
Não vou dizer para aproveitares bem, porque sei que vais aproveitar ao máximo, vais estar atenta a todos os pormenores e vais voltar com uma alma nova e mais rica.
Quando voltares, cá estarei a preparar (espero) as minhas férias.
BEIJOCAS PARA AS DUAS!
gm
boas férias, companheira do sonho!
olá amiga,
Desejo-te umas optimas férias...
Fico à espera... das fotos e dos teus comentários...
beijos
Sandra
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